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VIA APLICATIVO

AVATAR

 

Michelly

 

DIÁRIO DE CAMPO
 

Sites de relacionamento são hoje um dos principais meios de contato afetivo no mundo virtual. Misteriosos, escondem a identidade de seus usuários a sete chaves e geram curiosidade entre muita gente. O que rola nestes sites? O que se conversa? As redes sociais já não são suficientes para uma eventual paquera? Existem sites de paquera dentro do Facebook? Para matar a minha curiosidade e de vocês, fui incumbida da tarefa de analisar sites de relacionamento em redes sociais.  Vamos a esta jornada.

 

Um empurrão do destino me ajudou neste processo. Com a pesquisa já avançada fui admitida como estagiária em um dos maiores sites de paquera do Brasil. Mais um motivo para mergulhar nesse mundo, mas o Facebook era meu foco e o maior desafio. Encontrei por lá diversos aplicativos que trazem ao mundo dos sites de relacionamento certa dose de realidade.

Aí está o meu público. Gente que assume e paquera mesmo, para todo mundo ver. Convenhamos, o Facebook mostra nossos momentos, nosso nome completo, onde trabalhamos e quem são nossos amigos, é explícito. Para dar início ao processo, contei com algumas armas: um avatar bonito e bem- sucedido, uma pesquisa prévia sobre os principais sites de namoro que atuam no Facebook e uma boa lábia. 

 

Criei então Helena Gomes Stuart, uma publicitária de 42 anos, bonita e descolada. E entrei no Zoosk, um aplicativo de paquera no Facebook. Não deu certo. Helena não tinha foto, e sem foto, ninguém namora pela internet hoje em dia.  As pessoas estão mais cautelosas, pedem uma imagem, uma prova de que não é um fanfarrão qualquer ou até uma característica que faça valer a pena investir na conversa. Quando o papo rola pelas redes sociais normais, então, as coisas precisam ser mais claras, mais completas, mais verdadeiras.  E é essa a pegada do Facebook!

 

Quando nos cadastramos em um site de relacionamento típico, não temos um nome, e sim um apelido; não temos amigos, temos contatos lá criados. Isso torna muito mais fácil a criação de um fake. Já no Facebook, você precisa de uma rede, literalmente, ter amigos, emprego, família, fotos, fotos, fotos. Por esse motivo, minha experiência própria revelou que criar um fake no Facebook não é tão mole assim. As pessoas desconfiam se você tem menos de 50 amigos, não tem fotos de viagens e eventos, e principalmente, se você não posta nada no mural.

 

Decidi então, me tornar Helena. Coloquei algumas fotos do meu próprio perfil no Facebook, avisei a alguns amigos sobre a pesquisa (principalmente ao namorado) e fui com cara e coragem em busca de bofes na internet.

 

Encontrei diversos. Um garçom de Niterói, por exemplo, muito bonitinho, mas cheio de más intenções, queria me levar à Mariozin na Lapa e curtir uma night cheia de drinks e algo mais. As minhas recusas geraram um problema de auto-estima no cara que me deixaram numa bela saia justa. “O que tem de errado comigo?”. Nesta conversa consegui chegar à minha primeira conclusão da pesquisa: homens também são carentes e inseguros.

 

Outro papo foi com um garotão de meia idade querendo uma namorada novinha para tirar onda. Este tipo é clássico no Rio de Janeiro, então foi fácil desenvolver, mas o papo não teve muita novidade: aquele vai-e-vem, se você gosta de namorar em casa, qual a idade dos seus pais, se você ainda é virgem, se gosta de homens mais maduros, se tem uma cabeça madura e se não se importaria em viver à custa de um homem. Bom. Vamos para a próxima.

 

Encontrei também um americano procurando uma brasileira para provar do caldo. Uma coisa interessante deste americano em especial é que ele era bonito, muito bonito. Não que os outros fossem totalmente descartáveis, mas este era bastante atraente e bem-sucedido. Fiquei desconfiada, talvez fosse alguém fazendo uma pesquisa por lá também. A conversa com ele não durou muito, porque o Zoosk dá um limite para se conversar. Você conhece a pessoa, conversa uma vez, mas precisa fazer uma assinatura para prosseguir.

 

As duas conversas que mais renderam tiveram como interlocutores um indiano que se revelou adepto ao sexo virtual e um carioca, deficiente físico, em busca do amor eterno.  Foram eles os escolhidos como personagens em minha pesquisa. Inicialmente porque eu senti uma simpatia especial por esses personagens, e depois porque eles deram pano para a manga. Os outros eram muito comuns, aquela coisa que todo mundo já conhece. Com eles consegui mostrar com mais clareza o que há de diferente no Facebook. Eles tinham mais confiança em mim, por me verem ali, por saberem minha profissão, por serem adicionados como amigos.

 

O indiano criou uma espécie de relação com Helena, mas sempre com fins sexuais. Era impressionante como o coitado estava na seca, ou tinha grandes fetiches por brasileiras. Ele veio chegando de mansinho, falando da vida. Trabalhava como cientista da computação em Dubai. Conversávamos pela noite/madrugada no horário de Brasília, que coincidida com o horário de trabalho do felizardo. Havia uma ansiedade na conversa diária que tínhamos, era uma troca de informações e características culturais. Mas quando eu menos esperava, pimba! Ele fez a proposta de sexo pela internet! A Helena, como toda boa moça, hesitou e não aceitou o pedido, mas arrancou bons suspiros do moço. A conversa não terminou bem. O cara insinuou que brasileiras seriam vulgares. Acabou o papo.

 

Já Luiz, carioca, vendedor de bijuterias, me surpreendeu pela sinceridade. Ele chegou avisando: “sou moreno, deficiente físico, vendedor de bijuterias, gosto de curtir a vida”. Eu pensei logo: são dois opostos, um quer sexo, o outro quer amor, um faz sexo pela internet enquanto trabalha e o outro trabalha para um dia conhecer Miami. Lindo.

 

Luiz já queria marcar encontro na primeira conversa. Coisas de Facebook. Credibilidade é o que há. Me contou sobre o acidente que o deixou paraplégico e quais foram as limitações e os desafios que teve de enfrentar, entre eles achar uma namorada. A conversa teve três encontros virtuais, os primeiros despretensiosos, com troca de informações sobre a vida e desejos. Ele me pediu outra foto além da que estava publicada. Elogiou. Animado, indicou um barzinho interessante para o encontro. A conversa terminou com uma promessa de reencontro virtual no dia seguinte, que nunca aconteceu.

 

Estas experiências trouxeram à minha vivência profissional como estagiária de um site de relacionamento uma visão espelhada, percebendo o que rola do outro lado. Quem trabalha num site de paquera é o mesmo profissional competente que faz um projeto de marketing para uma multinacional, por exemplo. Isto é uma rede, isto é um negócio, isto é um mito. E o tempo é o maior aliado.

 

Horas no trânsito e trabalho cada vez mais exigente. A correria do estilo de vida urbano faz relacionamentos mais frágeis e torna o tempo curto. Não há espaço para aquele suspense que rola antes de um encontro real entre dois correspondentes virtuais. O Facebook já é meio caminho andado. E com o nome completo de alguém, hoje, o Google resolve o resto.

A inovação disso tudo é a paquera às claras. Mas os sites de paquera tradicionais continuam por aí, garantindo a privacidade de quem ainda preza esta característica. Afinal, computador poder ser a máscara mais utilizada no mundo.

 

 

 

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