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PARA OS EVANGÉLICOS

AVATAR

 

Nome: Rafael Soares           

 

Quem sou eu: “Seu falasse a língua dos homens, seu eu falasse a língua dos anjos, sem amor eu nada seria”

 

Idade: 21 anos

Estudante de Direito

 

Igreja: Catedral Presbiteriana do Rio de Janeiro

 

Interesses: Sou apaixonado por cinema e literatura. De Godard a García Marquez.

 

Hobbies: tocar violão, jogar futebol, ajudar quem precisa e orar muito.

DIÁRIO DE CAMPO
 

Uma palavra que pode definir bem o início da minha aventura no mundo da paquera evangélica é pitoresco. Isso porque antes mesmo de me cadastrar no site Amor em Cristo (cujo slogan, que aparece logo embaixo do título "O primeiro passo é orar. O segundo, procurar" é bastante significativo) tive que fazer um pequeno curso intensivo sobre a própria religião e jeitos de ser e se portar sendo evangélico, ou seja, o que é aceito o que não é, o que é legal e o que não é para jovens que praticam a religião. Após aprender a diferença entre presbiterianos e batistas e pentecostais e neopentecostais, comecei a me aventurar pelo site. No entanto, antes de criar meu perfil, comecei a explorar os recursos de apresentação do site, no link “Testemunhos”. Mesmo sem se cadastrar, qualquer um que entrar no site tem acesso a essa maravilha que são os testemunhos. São milhares de textos de gente que aprova o “Amor em Cristo” e encontrou sua alma gêmea lá. Há de tudo: de casados – como a Cleide e o Antônio, que agradecem até hoje ao AmoremCristo.com , intermédio usado por Deus para juntá-los em um relacionamento feliz e modesto – a namorados – como a Kelli e o Henrique, que esperam, em breve poder anunciar o noivado no próprio site – passando por pastores – como o pastor Pedrão – que indica o site para jovens que querem seguir os passos do Senhor.

 

Após dias lendo cerca de 30 Os “testemunhos”, resolvi, finalmente, criar meu perfil. Mas aí já é outra história...   

 

O perfil

 

A confecção de um perfil para entrar na rede evangélica foi uma saga que durou duas semanas. Isso porque os mecanismos de controle do site são muito rígidos e atuantes, submetendo qualquer perfil inscrito a uma minuciosa inspeção. Se o perfil for condizente com a moral e os bons costumes, entra; se não, recebe um e-mail agradecendo a participação e um “Tente de novo”. Como já pôde ser observado, eu não passei de primeira no “teste”.

 

A inscrição é composta de quatro partes. As informações básicas (nome, idade, e-mail) fazem parte da primeira. Depois vem as informações pessoais, com interesses de todo o tipo (livros, filmes, programas de TV). Se não fosse a grande abrangência de informações necessárias poderia se tratar de uma rede social comum. Na terceira parte, o lado profissional, ou seja, um batalhão de perguntas e possibilidades sobre empregos, formação, diplomas... Ainda um site normal.

 

O diferencial é a quarta e última parte do questionário – a referente à religião. Essa parte é bem mais extensa que as outras e as respostas não são livres, elas são restritas sempre a opções. Tudo relativo à religião é perguntado e depois é submetido a um teste de importância. Por exemplo: se a pergunta principal é “Quantas vezes por mês você vai à igreja?”, a segunda é “O quanto isso é importante na sua vida?”. E todas as questões seguem esse mesmo modelo.

 

Para construir meu perfil me baseei em certos exemplos pessoais, afinal não queria me basear nos estereótipos, o que depois acabou se provando uma decisão acertada. Tentei, ao máximo, não parecer exagerado, sem nunca esquecer de parecer atraente. Por atraente leia-se aqui “fiel a Deus”. Mesmo antes de entrar no site, percebi que, para fazer sucesso com as meninas, tinha que ser príncipe encantado: bem encaminhado na vida, estudando engenharia ou direito e frequentador assíduo de minha igreja.

 

Quanto à minha igreja, fiz minha escolha ponderadamente. Escolhi a igreja presbiteriana, pois, de acordo com o que havia aprendido anteriormente, os frequentadores dessa igreja não são tão radicais, circulam em praticamente todas as outras igrejas e se permitem certas extravagâncias, como roupas mais “ousadas”. A escolha perfeita para um iniciante.

Meu perfil já estava pronto. No site eu seria um estudante de direito de 21 anos apaixonado por cinema, que tocava violão e era do coral da igreja. Na minha descrição, a seguinte frase, retirada da Bíblia: “Seu falasse a língua dos homens, seu eu falasse a língua dos anjos, sem amor eu nada seria”. Infalível.

 

Mas eu havia esquecido um importante e fundamental detalhe: a foto. Sem a foto não podia cadastrar meu perfil. Sem problema. Peguei uma foto minha, para testar se o site era moderninho ou não, afinal tenho barba e alargador na orelha. Me cadastrei.

 

Dois dias depois, entro de novo no site, pensando que já estava cadastrado e podia começar a mexer na minha conta. Ledo engano. Minha foto havia sido rejeitada e eu precisava testar outra.

 

Nesse momento desisti de botar fotos minhas, afinal elas iam ser rejeitadas. Pedi ajuda a um amigo, que não tem barba. Perguntei se ele não tinha uma foto de roupa social, mais arrumadinho. Ele tinha uma ótima. No entanto, um detalhe não escapou à inspeção. Os óculos escuros do meu amigo não condiziam com a “política do site” e mais uma foto foi recusada. Pensei em desistir. Montar um perfil para um site evangélico já estava se tornando um desafio quase intransponível para mim, mas resolvi dar a última tacada: pedi outra foto ao meu amigo, dessa vez sem os óculos. Ele conseguiu. Dois dias depois, veio a confirmação: agora sim, eu era evangélico de carteirinha e podia entrar no clube.

 

Fazendo amigos

 

Mesmo com meu perfil aprovado, definitivamente não ia ser fácil me arranjar no AmorEmCristo.Com. Minhas primeiras tentativas de abordar meninas que o próprio site me sugeriu – há uma ferramenta que sugere pessoas com perfis parecidos com o seu – não foram bem sucedidas. Elas não respondiam e mesmo que eu insistisse, não recebia uma mensagem de volta. Por isso, fui à Catedral Presbiteriana do Rio para conhecer alguém que tinha um perfil no site e perguntar qual era o meu problema. Encontrei uma menina, Clara, de 25 anos, que me explicou que era difícil eu me infiltrar no círculo evangélico porque ele era muito fechado, as pessoas conheciam umas às outras mesmos nas outras igrejas e, se não conhecesse diretamente, havia algum amigo que conhecia. Também havia o fato de que, no site, como em outras redes sociais, as pessoas só falam com quem realmente conhecem, por isso seria difícil falar com alguém que nunca havia me visto antes. Mas não desisti.

 

Quando cheguei em casa, adicionei a maior parte de pessoas da Catedral Presbiteriana que consegui e, surpresa, recebi minha primeira mensagem de volta.

 

Estereótipos

 

Nesse ponto, é interessante registrar – admito – um preconceito que as visitas ao AmorEmCristo.Com ajudaram a quebrar. Geralmente quem não conhece nem convive com praticantes da religião tem uma imagem bem clara dos protestantes: meninas de saias longas e blusa fechada, meninos de camisa social comprida para dentro da calça e uma bíblia a tiracolo. Na primeira visita ao site, essa imagem, um tanto quanto pitoresca, foi definitivamente posta de lado. O que vi foram as mesmas pessoas de qualquer outra rede social. Meninas tirando fotos de frente para o espelho de saia, meninos fazendo careta de boné. Logicamente, algumas extravagâncias são devidamente proibidas, como fotos de biquíni, sem camisa, ou, curiosamente – de óculos escuros (sob o argumento de que não se deve, na foto principal, esconder o rosto). 

 

“Xavecos”

 

A mensagem não era nada demais. Só respondia o que eu havia perguntado (qual igreja ela freqüentava), mas era o estímulo que eu precisava para começar minhas incursões. Logo perdi a timidez e comecei a atirar para todos os lados usando um artifício que se mostrou bastante eficaz: “Você é exatamente o que Deus guardou para mim”. Simples, direto e, modéstia a parte, muito eficiente. Consegui manter longas conversas com três meninas – escolhidas em conjunto por mim e por minha namorada, que me auxiliou no processo – que ficaram espantadas com a minha fidelidade ao Senhor. Com a primeira, Taís, uma menina loura muito bonita, de 19 anos, estudante de engenharia na PUC e freqüentadora da Igreja Batista de Jacarepaguá, segui a linha mais atirado, apostando em passagens da Bíblia, que comprei unicamente com esse propósito, para “xavecá-la”.

 

“O amor é sofredor, é benigno; o amor não é invejoso; o amor não se vangloria, não se ensoberbece, não se porta inconvenientemente, não busca os seus próprios interesses, não se irrita, não suspeita mal; não se regozija com a injustiça, mas se regozija com a verdade; tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.” Essa era um dos exemplos de versículos que eu citava, logicamente dizendo que eu tinha decorado. Mas nosso papo esbarrou em um problema que permeou toda a minha trajetória no site: o fato de eu não poder encontrá-la. Em todas as nossas conversas ela pedia para eu fazer uma visita à Igreja dela, para que a gente pudesse orar junto e ela me apresentar à família e amigos. Como não podia encontrá-la (e minha namorada, definitivamente, não ia gostar nada disso), acabei deixando a relação esfriar para me concentrar no meu próximo “alvo”: a Gabi, uma surfista da Bola de Neve, uma igreja pela qual nutro grande curiosidade.

 

Gabi era uma menina normal, moradora da Barra, que começou a freqüentar a igreja por causa de seus amigos surfistas, nada de influências familiares. Ela era completamente diferente da Tais e com certeza não se surpreenderia com meus versículos “decorados”. Em nossos papos, a conversa girava sempre em torno da Bola de Neve, que me pareceu mais hippie do que evangélica, assim como a menina. No entanto, ela era bem mais difícil e nossa “relação” acabou se revelando infrutífera.

 

Com a terceira menina, não tive muito trabalho, ela se apaixonou perdidamente pelo meu perfil e queria porque queria conhecer meu avatar. Larissa já tinha 21 anos e, segundo suas próprias palavras, “estava em busca de um marido”. Todas as suas amigas já tinham se casado ou estavam com a data do casório marcada e ela, moradora do Méier, não queria ficar sem um partido. E para isso, já tinha tentado de tudo: rezou, fez uma lista com pretendentes, chamou todos para sair, rezou mais um pouco e nada. Foi aí que uma amiga aconselhou o AmorEmCristo.Com. Ela estava há duas semanas no site e não tinha conseguido nada, mas comigo ia ser diferente, afinal, de acordo com ela, ela era minha mulher dos sonhos: sabia cozinhar, arrumar a casa, era bonita, inteligente, estava estudando Direito para “ser rica” e, de quebra, ainda ia cuidar de mim. Uma oferta quase irrecusável. Mas infelizmente, estava comprometido e tinha uma matéria para escrever. Graças a Deus.

 

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